Adelfeirais

Há cerca de 66 milhões de anos, logo após a grande extinção dos dinossauros, o clima dominante na Península Ibérica era do tipo subtropical. Nesse tempo, comummente denominado de Terciário, a vegetação era muito diferente da atual. Aqui dominavam plantas de folhas sempre-verdes, largas e lustrosas (do tipo Laurissilva), adaptadas a um clima sempre quente e húmido.

Entretanto, há alguns milhões de anos, o clima da Península Ibérica começou progressivamente a arrefecer e a ter uma estação mais seca – o verão (características do clima Mediterrânico). Sem adaptações que lhes permitissem sobreviver a este novo clima, as plantas subtropicais foram desaparecendo e progressivamente substituídas por outras do tipo mediterrânico, semelhante à que todos conhecemos atualmente. Contudo, refugiadas em locais muito especiais do Sudoeste da Península Ibérica, permanecem ainda algumas daquelas plantas antigas, testemunhas do clima de outrora (as chamadas relíquias do Terciário).

A adelfeira de Monchique

História

Clique nas fotografias para ampliar

A adelfeira (Rhododendron ponticum subp. baeticum) é uma planta de origem antiga e um dos melhores exemplos de espécies relíquias que subsistem na Península Ibérica. Rhododendron ponticum é uma planta que evoluiu durante o período Terciário e que teve outrora uma distribuição alargada e contínua no sul do continente europeu. Contudo, com o arrefecimento climático e a progressiva instalação do clima Mediterrânico, foi desaparecendo, permanecendo apenas em alguns refúgios da Península Ibérica, Costa do Mar Negro e Líbano. Isoladas dos outros refúgios, as plantas da Península Ibérica foram evoluindo e diferenciando-se das plantas do Leste europeu. Este isolamento deu origem à subespécie baeticum, planta que hoje conhecemos como adelfeira, e que é uma planta rara e endémica do Sudoeste ibérico.

 

Distribuição geográfica

A adelfeira é uma planta muito rara, que só existe em algumas montanhas portuguesas e espanholas. Em Portugal, tem apenas duas populações disjuntas, uma na área de Monchique e outra no Caramulo. Em Espanha, tem o seu último refúgio nas montanhas do Aljibe (no Sul de Espanha – Andaluzia).

Distribuição global de Rhododendron ponticum subsp. baeticum (restrito à Península Ibérica).

Distribuição de Rhododendron ponticum subsp. baeticum (vermelho) e de Rhododendron ponticum subsp. ponticum (verde).

 

Biologia

Ilustração da flor da Adelfeira

Ilustração do fruto e da semente da Adelfeira

A adelfeira é uma planta da mesma família das urzes (família Ericaceae). É um arbusto perene e sempre-verde, que pode atingir os 3 m de altura. As flores são muito vistosas e grandes, entre o rosa-vivo e o lilás, com laivos alaranjados, reunindo-se em inflorescências compostas por 7 a 21 flores. A floração ocorre entre maio e julho (pontualmente também no Outono). Os frutos são cápsulas lenhosas com 2 a 3 cm, estreitas e oblongas, que abrem durante o outono-inverno.

Cada indivíduo produz anualmente inúmeras sementes de pequeno tamanho (<1mm), facilmente dispersadas pelo vento. Apesar disso, atualmente a regeneração natural é escassa e os juvenis estão praticamente ausentes nos adelfeirais. Tal deve-se à falta de condições climáticas adequadas à instalação de novas plântulas. Desta forma, nos nossos dias, a expansão das populações é assegurada quase exclusivamente por reprodução vegetativa.

Ecologia

Posição ecológica dos adelfeirais a área de intervenção do projeto LIFE em Monchique.

 

Dinâmica do Adelfeiral em Monchique

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Os adelfeirais encontram-se em áreas montanhosas, em climas relativamente quentes e húmidos, com elevada influência oceânica, onde as geadas são inexistentes. Globalmente, ocorrem de forma espontânea em duas posições ecológicas distintas: nas margens de cursos de água (posição ripícola); e em orlas ou em subcoberto de bosques de Quercus canarienses. Em ambos os casos, localizam-se sempre em solos ácidos e húmidos.

Os adelfeirais prestam serviços ambientais de elevada relevância para o bem-estar humano, nomeadamente: ajudam na proteção do solo, minimizando a erosão; contribuem para a formação de solo; são refúgio para outras espécies de flora e fauna; constituem uma enorme fonte de informação estética, artística, cultural, espiritual e histórica; e são importantes recursos genéticos.  Adicionalmente, são um habitat de extrema importância para a educação e ciência.

Curiosidade

Rhododendron ponticum foi introduzido nas Ilhas Britânicas no século XVIII, onde se tornou uma espécie exótica invasora. Estudos genéticos revelaram que o ancestral das Ilhas Britânicas é oriundo da Península Ibérica. Contudo, trabalhos recentes referem que os requisitos ambientais das plantas nativas ibéricas e das plantas de carácter invasor nas ilhas britânicas são muito diferentes. Esta situação sugere que, a dada altura, os ancestrais ibéricos poderão ter hibridado com outro parente próximo (outra espécie de Rhododendron), resultando numa planta altamente competitiva, capaz de invadir novos nichos.